A educação brasileira não serve ao capitalismo, e vice-versa

A educação brasileira não serve ao capitalismo, e vice-versa

É um problema para a sociedade brasileira que a educação não gere produtividade

Muitas são as expectativas da sociedade com a educação básica. Estamos no caminho para universalizar o acesso dos 6 aos 17 anos e, como não poderia deixar de ser, almejamos que a educação nos propulsione na direção a uma sociedade mais próspera, justa e participativa.

O artigo 205 da nossa Constituição não é menos ambicioso ao estabelecer que é objetivo da educação “o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Assim como a nossa Carta, nenhuma das declarações internacionais das quais o Brasil é signatário, como a de Incheon por exemplo, deixa de mencionar a importância do papel da educação para a inclusão produtiva e o trabalho. Nenhuma delas simplifica a educação a esse único papel.

No entanto, temos muitas expectativas e muito a alcançar. Conforme um país avança na oferta de mais anos de estudo para sua população, espera-se que também avance o desenvolvimento das competências para o mundo do trabalho e, por consequência, a empregabilidade e a produtividade.

Ao analisarmos a evolução dos anos de escolaridade da população brasileira de 1980 a 2019, observamos que passamos de uma população adulta com 2,6 anos de escolaridade média para 8,1 anos —um aumento de 211% do tempo na escola dos brasileiros. No entanto, o PIB (Produto Interno Bruto) por trabalhador, em mil dólares (deflacionados para 2017), passa de 31 para 32, apenas 3% de aumento.

O resultado brasileiro é diferente do de outros países, como Chile e Malásia, que ao aumentarem os anos de escolaridade, também aumentaram de forma considerável a produtividade. O componente de preparo para o mercado de trabalho e para a prosperidade econômica é uma das atribuições da educação, não é o único nem o menos importante.

É um problema para a sociedade brasileira que a educação não gere produtividade. Sabemos ser possível gerar mais riqueza individual e social, como acontece em outros países.

Duas são as hipóteses para esse fenômeno brasileiro: ou a educação precisa aprimorar o desenvolvimento de competências para o mundo do trabalho e/ou a economia brasileira não está sabendo aproveitar a maior escolaridade das gerações mais novas.

Urge corrigirmos ambos, tanto desenvolvermos um currículo mais amigável ao sistema produtivo como estimularmos que o sistema produtivo não subutilize o conhecimento dos trabalhadores.

As implicações para a política pública são imediatas: precisamos analisar se o currículo da educação básica está atento às necessidades do mundo do trabalho. A política educacional precisa gerar essa aproximação. A política econômica também precisa avaliar se está alocando e aproveitando adequadamente as já adquiridas competências dos trabalhadores brasileiros recém-formados.

Laura Müller Machado
Professora do Insper; mestre em Economia Aplicada pela USP; integrante do coletivo Derrubando Muros.

Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo em 8 de setembro de 2023.