Considerações para que o Brasil possa se tornar uma potência verde global
“O Brasil pode ser a referência de potência verde global” foi das frases que mais ouvimos nos encontros de que participamos com lideranças internacionais de governos, sociedade civil, empresas, bancos e instituições multilaterais durante a Semana do Clima de Nova York, um dos maiores eventos mundiais sobre o tema, realizada há dez dias. O que pode parecer uma visão otimista é, na verdade, uma constatação.
O país tem grandes vantagens comparativas —abriga a floresta amazônica, sai na frente na transição energética com sua matriz elétrica majoritariamente renovável e tem alto potencial de escalar práticas de agricultura regenerativa e de baixo carbono, além da bioeconomia. Portanto, a janela de oportunidade que o país tem para efetivar essa visão é única, partindo da Cúpula da Amazônia em agosto, a presidência do G20 a partir de dezembro e a COP30 em Belém (PA) em 2025.
Temos em abundância os recursos naturais que o mundo precisa preservar, como as florestas, e os necessários para o mundo transitar, incluindo minerais estratégicos e terras raras. O que precisamos é de uma visão integrada e coerente, capaz de responder às questões imediatas, mas salvaguardando no longo prazo o nosso futuro coletivo.
Esse tema foi discutido em um desses encontros em Nova York, do qual o Instituto Igarapé foi um dos organizadores. Nele, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou a um grupo de formadores de opinião e tomadores de decisão de diversos países os eixos do Plano de Transformação Ecológica, que propõe uma abordagem estratégica integrada em cima de seis pilares: finanças sustentáveis, adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética, economia circular e nova infraestrutura e adaptação.
Na construção desse plano, nosso papel, como sociedade civil, é fazer as perguntas difíceis e contribuir com informação qualificada para balizar políticas públicas fundamentadas e responsáveis. O Igarapé acaba de lançar um estudo sobre um elemento-chave na discussão de um desses pilares, o da transição energética. Trata-se dos minerais estratégicos, indispensáveis na transição para uma economia de baixo carbono. No relatório “Minerais Críticos e Estratégicos do Brasil em um Mundo em Transformação”, apresentamos um quadro amplo da diversificada oferta do país e alertamos para o fato de que o Brasil precisa definir seu papel e sua estratégia nesse mercado, se quiser responder à demanda mundial por energia renovável e garantir uma política socioambiental responsável na exploração de seus recursos naturais.
Os acordos climáticos e a prolongada guerra entre a Rússia e a Ucrânia geraram uma corrida dos países desenvolvidos por maiores reservas. Na complicada geopolítica da transição energética, o Brasil pode ter um papel de destaque.
A Amazônia Legal concentra 30% das reservas conhecidas de minerais estratégicos no país. Apesar de ainda não ser um grande ator nesse mercado, o Brasil abriga 94% das reservas mundiais de nióbio, 22% de grafite e 16% de níquel, além de representar 17% de terras raras, o terceiro maior depósito do planeta.
Precisamos trazer o holofote para a discussão dos custos e benefícios da exploração desses minerais que estão na matriz da transição energética —e de quem são os custos e para quem são os benefícios. Esse é um desafio não apenas para o Brasil, mas para os países do chamado Sul Global, que concentram mais de 90% dessas reservas.
A hora de se buscar um pacto em torno da transição ecológica justa é agora. Essa janela de oportunidade será bem aproveitada se nos abrirmos para novos conhecimentos e possibilidades. Para o Brasil potência verde se tornar realidade, temos que ter a capacidade de tomar decisões com visão de futuro.
Ilona Szabó de Carvalho
Presidente do Instituto Igarapé; membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral da ONU; mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia); integrante do coletivo Derrubando Muros.
Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo em 3 de outubro de 2023.