Semelhança da evolução da alta dos juros nas duas economias impressiona
O Brasil apresenta juros reais elevados. O juro neutro brasileiro —isto é, a taxa real de juros que equilibra a oferta com a procura, mantém a economia a pleno emprego e a inflação estável e na meta— é elevado. Os cálculos mais recentes indicam 4,5% para a taxa real de juros neutra da economia brasileira. Tratei dos motivos que produzem o elevado custo de capital por aqui na coluna de 12 de março.
Quando a inflação está elevada e é necessário desinflacionar, os juros reais são fixados acima do juro neutro para esfriar a economia. Diz-se que a política monetária é contracionista. O grau de contração da política monetária é dado pela diferença entre a taxa real neutra e a taxa real praticada.
A taxa de juros real praticada é dada pela taxa de juros nominal praticada líquida de uma medida da expectativa de inflação. A figura investiga a evolução da contração monetária para a economia brasileira e a americana.
Para a economia brasileira, consideramos os juros do mercado interbancário de um ano líquido da expectativa de inflação 12 meses à frente, dados pela pesquisa Focus, conduzida semanalmente pelo Banco Central. Para obtermos o grau de contração monetária subtraímos do resultado a taxa neutra dada por 4,5% para o Brasil.
Para a economia americana, consideramos os juros do mercado interbancário de um ano líquido da expectativa de inflação 12 meses à frente, dada pela inflação implícita pelo mercado. Para obtermos a contração monetária para a economia americana, subtraímos a taxa real neutra de juro, de 1% no caso.
O ciclo americano iniciou-se pouco menos de um ano e quatro meses em seguida ao ciclo brasileiro. O mínimo da contração monetária brasileira, -5,67%, ocorreu no dia 4 de dezembro de 2020. Para os EUA o mínimo, -5,96%, ocorreu em 23 de março de 2022. Na figura, o mínimo para os EUA “ocorre” na mesma data, em 4 de dezembro de 2020, que para a série brasileira. Não se trata de erro. As datas no gráfico foram adiantadas para os EUA, como se os ciclos tivessem ocorrido simultaneamente (não ocorreram), apenas para facilitar a comparação entre as linhas.
O que impressiona é a semelhança da evolução da contração monetária em ambas as economias. Toda a diferença de juro real entre a economia brasileira e americana no atual ciclo deve-se aos 3,5 pontos percentuais de diferença entre os juros neutros. No atual ciclo monetário, a amplitude não tem sido maior para o Brasil relativamente ao caso americano.
Samuel Pessôa
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO); doutor em economia pela USP; integrante do coletivo Derrubando Muros.
Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo em 7 de outubro de 2023.