Não há nada a temer com a reforma dos impostos indiretos
Há grande preocupação dos impactos da Reforma Tributária dos impostos indiretos sobre o custo de alguns setores, principalmente os serviços.
A preocupação deve-se ao fato de os serviços terem poucos custos. Assim, o novo imposto aumentaria o preço para o consumidor da aquisição dos serviços.
É útil fazermos um pouco de conta. Hoje, uma escola paga, entre Cofins, PIS e ISS, algo em torno de 6%. Se o faturamento líquido dos impostos da escola é de 100, o custo da mensalidade será de 106.
Após a reforma e com a instituição do imposto sobre o valor adicionado (IVA), incidirá sobre a mensalidade escolar a alíquota de 25% –se for alíquota cheia (de fato, segundo o texto aprovado na Câmara, pagará 10%, isto é, 40% da tarifa plena de 25%). De qualquer forma, vamos fazer as contas sob a hipótese de que não haja regime especial para a escola.
Segundo o IBGE, a escola adquire insumos —aluguel, contas e material— no valor de 27% do faturamento. Assim, o imposto que pagará será 25% sobre 73% (100-27). Resultam 18%. O custo da mensalidade após a reforma será de 118 ante 106, elevação de 11%. Mas há ainda outro efeito: os insumos ficarão mais baratos pois os impostos deixarão de ser cumulativos.
Segundo simulações dos professores da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Edson Domingues e Débora Freire Cardoso, esse efeito é da ordem de 3% aproximadamente. Ou seja, será possível cobrar 115, mantendo os salários e a rentabilidade do negócio constante. Temos, portanto, mensalidade de 115 ante 106, se as escolas não tiverem alíquota diferenciada. Trata-se de uma elevação de 8,5%, significativamente inferior aos 25% da alíquota cheia do IVA.
Então todos tirarão seus filhos das escolas? Difícil responder a essa pergunta, pois a reforma altera todos os preços da economia. Ela também altera a renda das pessoas e a produção total.
Ora, se todos deixarem de consumir, pois o preço de um bem ou serviço final ficou mais alto em razão de um imposto, então a Reforma Tributária elevará a taxa de poupança da economia. Os juros cairão e, provavelmente, os investimentos elevar-se-ão. Mas é difícil imaginar que a Reforma Tributária aumentará significativamente a poupança do país. O consumo será realocado.
Para considerar todos esses efeitos de repercussão —os economistas chamam de efeitos de equilíbrio geral—, é necessário simular a reforma com um modelo computável de equilíbrio geral. Os mesmos professores simularam os efeitos, empregando hipóteses bem conservadoras. Em particular, no cenário-base, não consideraram que a reforma eleva a produtividade da economia em razão da redução do custo de conformidade das empresas e dos litígios. (É sempre bom lembrar que os litígios tributários na esfera administrativa e jurídica dos três níveis da federação totalizam hoje 70% do PIB, aproximadamente.)
Sob essas hipóteses bastante conservadoras, o produto da economia crescerá 4%, e o consumo das famílias, 1,5%. A alíquota que mantém a receita dos impostos constante é de 24%. Para a educação, haverá uma queda de produção de 5%. Outros setores cujo produto cairá —sob a hipótese de nenhum ganho apreciável de produtividade— são saúde mercantil, 3,7%; serviços pessoais, 6,3%; clubes, 2,6%; e alimentação fora do domicílio, 0,5%. Os demais 61 setores terão sua produção elevada.
Na simulação que considera um ganho de eficiência que redunda em elevação do PIB, após alguns anos, de 12%, o setor com a menor elevação da produção —setor de serviços pessoais— crescerá 4%.
Não há nada a temer com a reforma dos impostos indiretos. Todos ganharão.
Samuel Pessôa
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO); doutor em economia pela USP; integrante do coletivo Derrubando Muros.
Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo em 29 de Julho 2023.