Mudanças educacionais e climáticas são urgentes

Mudanças educacionais e climáticas são urgentes

Precisamos estabelecer um pacto social que reconheça a educação como estratégia essencial no combate à crise climática

A crise climática solicita uma agenda de transformação ecológica estrutural, intensiva em inovações tecnológicas e em capital humano crítico e criativo, além de mudanças de hábitos e comportamentos frente à natureza. A educação, da formação básica à pesquisa de ponta, assume protagonismo nessa escolha.

O sentido de urgência ressoa, simultaneamente, na dimensão de mitigação — necessidade de redução das emissões de gases de efeito estufa para conter o aquecimento global — e na de adaptação — preparação da sociedade para enfrentar as mudanças futuras e já em curso.

No cotidiano das escolas os desafios de adaptação já são evidentes. Exigem desde a melhoria da infraestrutura — conforme reportagem do GLOBO, 70% dos estabelecimentos de ensino não possuem climatização — até mudanças em procedimentos. Por exemplo, em dias de temperaturas extremas, pode ser necessário repensar atividades esportivas, uma vez que o calor constante pode afetar negativamente o aprendizado e bem-estar.

Também precisamos criar planos de contingência para desastres naturais que possam levar ao fechamento das escolas.

Essas adversidades não impactam apenas o conforto ou desempenho dos estudantes, mas sua saúde mental. Hickman e coautores revelam, em artigo publicado em 2021 na revista The Lancet, que a ansiedade ambiental é crescente entre os jovens, sublinhando a influência direta das mudanças climáticas em sua qualidade de vida.

Os autores realizaram uma pesquisa com mais de 10 mil jovens em dez países, incluindo o Brasil, e encontraram níveis significativos de sofrimento psicológico associados às alterações climáticas, exacerbados pela incapacidade dos governos em agir rapidamente.

Na educação básica, a Unesco destaca, em relatório de 2022, o papel da educação ambiental, lembrando que sua importância é reconhecida há décadas, apesar da desconexão entre a política e a prática.

O relatório nos lembra que “o movimento climático estimulou as crianças a se tornarem participantes ativos para garantir que suas visões de seus próprios futuros sejam ouvidas e implementadas”. Essa abordagem é essencial para capacitar cidadãos a resolver conflitos e desafios decorrentes da crise ambiental, indo além da mera conscientização sobre o tema.

Nesse contexto, o documento “Diretrizes de educação climática ambiental” lançado no mês passado pela Fundação Brasil de Educação Ambiental a partir de uma consulta pública, oferece orientações valiosas.

Entre dez diretrizes propostas, destaca-se que a educação climática deve ser transversal, integrando diferentes áreas do conhecimento, e baseada em evidências científicas. Além disso, sustenta que sem educação ambiental efetiva as demais políticas setoriais nesta frente serão frágeis, pois, entre outras, a mobilização da população é fundamental para construção e fortalecimento de suas capacidades adaptativas e resiliência, priorizando comunidades socioambientalmente vulneráveis.

Com efeito, as mudanças climáticas aliam relevância e urgência social com a demanda dos estudantes de maior pertinência dos estudos. Não é desejável criar nova disciplina, mas sim uma abordagem interdisciplinar.

Além das ciências biológicas e exatas, há possibilidades de integração com a geografia e a história, com a sociologia e a filosofia, afinal a emergência climática diz respeito, no limite, à existência humana. Permite, ainda, integrar ações de intervenção prática na realidade, aproximando escolas e estudantes dos movimentos sociais e dando vazão à sua ação comunitária e cidadã.

Além de urgentes e importantes, as mudanças climáticas representam uma oportunidade significativa para revigorar uma educação que se tornou abstrata para os alunos, tornando a escola mais atraente. Não a podemos desperdiçar.

Precisamos estabelecer um pacto social que reconheça a educação como estratégia essencial no combate à crise climática, imbuída de urgência, compromisso ético e responsabilidade com a qualidade de vida.

É crucial fomentar a conexão entre conhecimentos, habilidades e valores na educação básica para fortalecer uma geração de estudantes capaz de compreender os desafios, construir soluções inovadoras e liderar mudanças essenciais.

Esse caminho contribui para a construção de uma cidadania verde em sintonia com as possibilidades derivadas de uma transformação ecológica sistêmica e estrutural que pode consolidar a identidade do Brasil como potência socioambiental. É um desafio significativo, no qual a educação tem muito a contribuir, no presente e no futuro.

Ricardo Henriques
Superintendente-executivo do Instituto Unibanco; professor associado da Fundação Dom Cabral; integrante do coletivo Derrubando Muros.

Artigo originalmente publicado no O Globo em 23 de outubro de 2023.